Minha Vida Injusta - Parte 2: 08 de Fevereiro de 1982

Bem, ganhei isso aqui no natal passado, um mega diário com a capa dos Beatles, não sou muito fã de Beatles, mas sabe como é, presente de familiares no natal é sempre uma merda, fiquei quase um mês pensando o que eu faria com isso, e pensei “por que não escrever sobre a minha vida chata?”.

Nunca entendi muito bem a finalidade de um diário, acho meio imbecil você escrever algo que somente você irá ler, algumas garotas da minha escola têm diário e dizem que é uma forma de expressar os seus sentimentos e toda aquela baboseira de meninas.

Provavelmente nunca mais irei escrever aqui, devo perder esse diário daqui a alguns meses, então não vou dar muita importância para ele, já que sei que ninguém irá ler isso, mas sei lá, vou deixá-lo sempre sem cadeado, vai que algum curioso se interesse pela minha vida.

Ah, eu tenho que me apresentar, não é mesmo? Bem, meu nome é Henrique Soares, tenho 11 anos, irei fazer 12 daqui a uma semana, sou filho de uma faxineira e de um alcoólatra, filho único, não tenho dinheiro, sou pobre, moro no Rio de Janeiro, não tenho muitos amigos, meu sonho é me tornar um escritor, assim como Nelson Rodrigues, eu gosto de Nelson Rodrigues, quem sabe eu consiga escrever peças de teatro também, apesar de não gostar muito de teatro.

Agora tenho que falar sobre o meu dia, não é isso que fazem em diários? Bem, acordei cedo e fui para a escola, foi o primeiro dia de aula no ano, mas como sempre, nunca acontece nada de importante lá, é sempre chata, não copio a matéria, pois acho que tudo aquilo é um monte de idiotice, sempre volto da escola com o Jimmy, e esse ano parece que não vai ser diferente, ele é o meu melhor amigo, o conheço desde os 6 anos, nós conversamos sobre a nossa vida e principalmente sobre música, mas ultimamente estamos conversando bastante sobre garotas, tem uma garota nova lá na sala, seu nome é Simone, ela é bonita mas não conversei com ela, o Jimmy sim e disse que ela é legal, pretendo falar com ela em breve.

Cheguei em casa e meu pai me bateu, isso sempre acontece, eram 14 horas e ele já estava bêbado, as vezes ele batia na minha mãe também, mas parou desde o natal passado, onde minha mãe o ameaçou com óleo quente. Enfim, ele me bateu sem motivo, não o respondo nunca, apenas vou para o meu quarto, a minha mãe estava trabalhando, ela só chega em casa as uma da manhã, fiquei no meu quarto e comecei a ler “Bonitinha mas Ordinária” pela segunda vez, peguei no sono, quando acordei já estava de noite, eram umas 19 horas, acordei com Jimmy me chamando no portão.

Meu pai não estava em casa, tinha certeza de que ele foi para algum bar, ele não tem emprego, e isso é uma droga, pelo menos sem ele eu podia receber o Jimmy em minha casa. Eu não tenho Tv, então passamos o tempo jogando damas, eu sou muito bom em damas, o Jimmy não, teve uma hora em que fiquei com pena e o deixei ganhar, quando meu pai chegou eu pedi para o Jimmy ir embora, voltei para o meu quarto e comecei a escrever aqui, bem, esse foi o meu dia, foi bem chato.

Já sei, acho que só irei escrever aqui quando acontecer algo importante em minha vida, para não ficar muito repetitivo. É, pode ser. Bem, então é isso, até a próxima.


Henrique Soares, 08 de Fevereiro de 1982.

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