No começo é assim. Você vai fazendo arroz, e vai queimando o arroz, ou colocando alho demais, ou sal de menos. Às vezes você faz aquele arroz de saquinho que só precisa colocar na água, mas percebe que aquilo tem gosto de isopor molhado, e se é para comer arroz ruim, que faça você mesmo o arroz. E você faz o arroz, e com o tempo percebe que você tem melhorado naquilo, afinal, é só arroz. Você viu alguém fazendo direito, você já tem experiência fazendo, provavelmente cometeu todos os erros possíveis na elaboração de um arroz (incluindo a vez quando você foi no supermercado com pressa e acabou comprando arroz integral sem querer e teve que comer aquela merda a semana inteira) e um dia, sem perceber, você está fazendo um arroz decente.
Talvez ainda não seja o melhor arroz do mundo. Merda, talvez não seja o melhor arroz nem do seu condomínio. Mas ainda assim, arroz. Um arroz que você precisa pra sobreviver, e sabe de uma coisa, um arroz que dá até um certo orgulho. Um arroz, quem sabe, que você se acostuma e acha que não tem nada demais, mas algum dia alguém pode provar e achar especial. E talvez até achar que por causa do arroz você também é especial. Logo você, que nunca se preocupou em fazer o melhor arroz do mundo. Apenas fez. Porque tinha que fazer, porque queria fazer, porque precisava fazer. Claro, se dedicou a fazer arroz, mas sem vislumbrar nele maiores pretensões. Afinal, é só arroz.
Escrever é um pouco como fazer arroz. É difícil perceber isso no início. Você começa a escrever principalmente porque viu alguém fazendo isso muito bem. E com o tempo vai encontrando mais e mais pessoas que fazem isso muito bem, e que começam lentamente a formar o seu gosto pela leitura. E você tenta escrever pela primeira vez e percebe que seu texto está muito longe do que o Verissimo faz. E nota que sua ideia para um seriado não passou de uma releitura de Entourage, e que aquele seu roteiro para um filme é tão ruim que até o Nicolas Cage aceitaria participar. Mas o que eu quero dizer é que isso é normal. Seu senso crítico continua evoluído, mas sua escrita ainda não. E você deve passar por essa fase.
E mais que passar, é importante aprender com essa fase. A cada texto que você termina, relê e sente vontade apagar, ou simplesmente deixar escondido, como aquela barata que você matou mas deixou em um canto da sala pra não ter mais que mexer com aquilo, é preciso se desenvolver. O George disse uma vez que sentia muita dificuldade de compor quando estava nos Beatles, porque Paul e John tinham escrito todas as músicas ruins deles na época de colégio, muito antes de entrarem em um estúdio para gravar, e ele teria que partir do zero e tentar fazer algo que se comparasse às composições geniais deles se quisesse gravar uma música própria. Mais do que ler tudo aquilo que se torna referência para você, o mais importante é escrever tudo que puder. Sim, este blog são minhas canções ruins de adolescentes do John e do Paul, espero que vocês não se importem.
Escrevi esse texto para mim. Para sempre que alguma vez que eu passar os olhos no blog e nos meus textos, eu achar que tem algum propósito e conter o impulso de deletar e esconder isso do mundo. E para continuar escrevendo. E, quem sabe, ficar bom nisso. Escrevi para mim, mas talvez sirva para mais algúem. É só arroz.
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